Até concessionárias praticam irregularidades que, além de ilegais, colocam em risco a segurança do automóvel
Estava em Paris há alguns anos para um lançamento e, numa tarde livre, entrei numa loja de acessórios e equipamentos para automóveis. Tinha na época um Passat (alemão) e perguntei sobre um chip para aumentar sua potência. O vendedor, solícito, mostrou uns dois ou três explicando a diferença entre eles. O preço era mais ou menos o mesmo, oscilava entre 150 e 200 euros. Decidi então comprar o que me pareceu menos “agressivo” ao motor e perguntei ao vendedor se poderia pagar com cartão de crédito. Ele confirmou e perguntou para qual oficina eu levaria o automóvel para instalar o chip. Expliquei então que o carro estava no Brasil e que a instalação seria feita numa oficina local. Ele não entendeu e explicou que eu não poderia levar o chip pessoalmente. Eu também não entendi e perguntei como fazer para adquiri-lo. Ele pacientemente me fez entender que era proibido vender o chip diretamente para o proprietário, mas apenas para a oficina homologada pelo governo para realizar a transformação. E que lá, o engenheiro responsável iria determinar (e orçar) as modificações a serem introduzidas no automóvel para adequá-lo ao novo desempenho. Pedi desculpas, expliquei ignorar a legislação, que no Brasil não era bem assim, rabo entre as pernas e me mandei, ligeiramente envergonhado. Lembrei-me deste episódio a propósito do dono de um Gol em Belo Horizonte que, na semana passada, preparou o carro para uma competição de arrancada (instalou turbo e/ou nitrogênio) e foi “experimentá-lo” numa movimentada avenida da cidade. Foi parar na contra-mão a muito mais que 100 por hora e matou o casal do Palio que atingiu de frente. O Brasil tem também uma legislação que proíbe a alteração das características originais do automóvel, muito pouco respeitada. Pois a fiscalização, além de precária, só percebe as modificações mais óbvias, como suspensão rebaixada, rodas maiores e mais largas, escapamento “aberto”, etc. Teoricamente, qualquer alteração mecânica deveria ser realizada (ou aprovada) por uma empresa homologada pelo Detran, que emitiria um certificado atestando a segurança do automóvel. Mas, na prática a teoria é outra. Automóveis são alterados a torto e a direito sem nenhuma preocupação com a segurança. Oficinas irresponsáveis chegam a cortar longarinas do chassis para permitir a troca de rodas originais por outras mais largas. E outros descalabros do gênero. Já testemunhei a troca do chip de uma injeção eletrônica para dar mais potência ao motor de uma picape Mitsubishi. Sabe onde? Numa concessionária da marca. Sem nenhuma alteração nos freios ou na suspensão para adequá-la ao repotenciamento. Como um policial do trânsito vai perceber esta alteração que não deixa vestígio externo? Perceber um chip alterado é impossível, sem um computador específico por perto. Mesmo o motor que recebe uma turbina depois que deixou a fábrica (e pode ter sua potência dobrada): a polícia identificaria a adaptação numa blitz noturna? O Brasil é o país do faz-de-conta quando se trata de segurança veicular. Seria cômico, não fosse triste e preocupante, que o Detran esteja neste momento analisando a possibilidade de permitir a “adaptação” de um terceiro ponto de fixação do cinto de segurança, quebra-galho para se instalar as cadeirinhas nas vans escolares. “Quem sabe se faz um reforço estrutural?” arrisca um técnico do órgão, sem ter noção do tamanho da besteira que disse. Menos ainda do tamanho do esforço (superior a uma tonelada) a ser suportado pelo cinto no caso de um impacto. Ele “resolve” o problema das vans à custa da segurança dos escolares.
Fonte: R7
Publicado em: 2015-08-11T13:05:00-03:00
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